A Constituição Federal é a Carta
Magna, que rege o tudo no País, pelo menos deveria. Mas, nesses dias de
manifestação popular – que se espalham pelo Brasil – em especial a de
quinta-feira, feita por amigos e familiares do infante Gabriel Levy, que
faleceu de forma “desconhecida” depois de ter sido atendido no Hospital
Geral José Mendes, aqui em Itacoatiara; depois no fim da tarde de ontem, um
grupo de pessoas se manifestou (...); e agora nessa manhã no dia 15 de março, grande
parte das pessoas, Brasil à dentro, se manifestam contra o governo petista,
contra a corrupção (...). Mas todas essas manifestações estão garantidas na Constituição
Federal Brasileira.
A primeira manifestação de autoridade
dos Brasileiros está determinada no texto do parágrafo único do artigo 1º desta
Lei Principal: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Essa
garantia constitucional do Poder do Povo, se acentua nos Incisos do Artigo 5º. Em
destaque o “IV” que diz:
“IV – é livre
a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”
e os seguintes:
“VI - é
inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre
exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos
locais de culto e a suas liturgias;
(...)
VIII -
ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção
filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a
todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é
livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença;”
Então, fica claro que todos –
inclusive eu – podem se manifestar, contra ou em favor de algo ou alguém, e
esse direito está assegurado na Constituição Brasileira. Porém, com base na
mesma Lei, podemos – inclusive eu – não nos manifestarmos publicamente, como
muitos fizeram e estão fazendo, ontem, hoje e “amanhã”; mas isso de forma
alguma quer dizer que não esteja aqui no meu íntimo sendo totalmente favorável
às manifestações populares.
Mas no jogo da política – e manifestação
pública é ato político – outro componente se faz claro a séculos: o jogo de
xadrez.
Esse jogo milenar foi proibido
pela igreja católica – mesmo sendo jogado por seus integrantes – teve no Papa
Inocêncio III, que exerceu seu pontificado entre os anos de 1198 e 1216, seu
principal contribuinte e regulador, com as conhecidas “regras da moralidade”.
Diria até que Inocêncio profetizou que o jogo de xadrez seria o jogo do poder –
se é que já não era.
Naquela época, alguns membros da
Cúria Romana passara a usar o xadrez em alegorias conhecidas como “moralidades”,
prática homilética comum na literatura europeia da Idade Média, que tentava dar
uma explicação simbólica ou alegórica ao jogo, tentando encontrar paralelos
entre a organização da vida e atividades humanas e o xadrez. Essas alegorias
geralmente consideravam o jogo como emblemático da condição social da época. Um
dos mais belos textos das “moralidades”, passo a transcrever:
“A RAINHA
move-se e toma [isto é, captura peças adversárias] na diagonal [essa é uma
regra antiga], de modo torto, pois a mulher é tão cobiçosa que só toma tortamente,
por obra da rapina e da injustiça. A TORRE é o justiceiro que
percorre toda a terra em linha reta como sinal da justiça com que tudo julga e
de que por nada deve seu ofício corromper-se. [...] O movimento do CAVALEIRO
é composição de reto e torto. O reto, representando o direito que tem, em
justiça, como senhor da propriedade, de cobrar impostos e de impor justas penas
conforme o exija o delito; representando as injustas extorsões a que submete os
súditos. [...] Os BISPOS movem-se oblíqua e tortuosamente duas
casas [outra regra de movimento antiga] porque muitos prelados se pervertem
pelo ódio, pelos presentes, ou favores para não corrigir os delinquentes nem
ladrar contra os vícios, tratando os pecados como um terreno arrendado por uma taxa
anual. E assim enriquecem o diabo, fomentando os vícios ao invés de extirpá-los
e se tornam procuradores do diabo. [Observar o anticlericalismo do texto!] Os PEÕES
são os pobres que andam uma casa em linha reta, pois enquanto o pobre permanece
na sua simplicidade vive honestamente, mas, para tomar, se corrompe e o faz
tortamente, pois pela cobiça se bens ou honras, sai do reto caminho com falsos
juramentos, adulações ou mentiras. [...] O diabo diz: ‘xeque!’ incitando ao mal
e ferindo com o dardo do pecado. E se o atingido não sai rapidamente dizendo: ‘livre!’,
pela penitência e compunção do coração, o diabo lhe diz: ‘mate!’, levando sua
alma ao inferno de onde não se poderá livrar de modo algum.”
O texto sobre o “REI” não
foi encontrado na pesquisa para a construção deste texto, mas ele é o objeto da
proteção de todas as outras peças. Quando ele, o “REI” é conquistado ou
ameaçado sem possibilidade de defesa ou fuga, o jogo acaba.
Na política, esse jogo dita as
regras do “jogo”. As manifestações feitas pelo Brasil no dia de hoje – iniciadas
em junho de 1013 – são constitucionais, mas a movimentação das “peças” é jogo
de xadrez. Mas quem são essas peças, no tabuleiro político brasileiro?
Seguindo o “roteiro” do Papa
Inocêncio, posso supor que:
A “RAINHA”
pode ser a CORRUPÇÃO, que corre para todos os lados capturando todos que
encontra pela frente;
A “TORRE”
pode ser a JUSTIÇA que só corre nas linhas retas da Justiça, mas não tem
conseguido pegar a “rainha”, por ela ter “outras casas” para se esconder;
Os Cavalos ou “CAVALEIROS”
podem ser os POLÍTICOS, que correm em “linha reta” e em “linha torta”, num
mesmo movimento, mostrando o quanto estão suscetíveis às influências da
Corrupção – que se tornou o principal movimento dos “cavaleiros” do Brasil;
Os “BISPOS”
podem ser os clérigos, que cedem aos encantos da corrupção, e tal qual os
Cavaleiros do Congresso, seguem os caminhos da obliquidade moral, vendendo seus
rebanhos aos mesmos cavaleiros profanos;
Os “PEÕES”,
os pobres coitados – como diz Inocêncio – podem ser todos que buscam de forma
ignorante, defender o “REI” déspota e corrupto.
Termino este texto dizendo que
qualquer pessoa tem o direito de se manifestar sobre o que desejaram e em
defesa ou em crítica contra quem e contra o que desejar. Nós, povo, temos esse
direito assegurado na Lei Magna e os políticos também, da mesma forma podem defender
quem e o que desejarem.
No jogo do xadrez político,
considero todos os que defendem de forma ignorante aos líderes políticos, sem
sequem pensarem no que seus defendidos – normalmente ocupantes do Poder Executivo
– estão fazendo de danoso para o País, para os Estados e para os Municípios.
É Constitucional a defesa dos
interesses pessoais; É jogo de xadrez defender os interesses políticos de forma
ignorante.
Dizer – como disse o presidente
nacional do PT – que os brasileiros que se manifestaram contra o atual governo,
contra a corrupção e contra tudo que foi colocado, não representa o País é
discurso de peão; de gente que não respeita a Constituição e que tenta
desqualificar tudo e todos que são contrários. Por outro lado, tal comportamento,
antes de ser democrático, é ditatorialista.
Pense: quem é você nesse
tabuleiro?
Boa semana.