"Sempre fomos livres nas profundezas de nosso coração, totalmente livres, homens e mulheres.
Fomos escravos no mundo externo, mas homens e mulheres livres em nossa alma e espírito."
Maharal de Praga (1525-1609)

domingo, 15 de março de 2015

A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA E O JOGO DE XADREZ



A Constituição Federal é a Carta Magna, que rege o tudo no País, pelo menos deveria. Mas, nesses dias de manifestação popular – que se espalham pelo Brasil – em especial a de quinta-feira, feita por amigos e familiares do infante Gabriel Levy, que faleceu de forma “desconhecida” depois de ter sido atendido no Hospital Geral José Mendes, aqui em Itacoatiara; depois no fim da tarde de ontem, um grupo de pessoas se manifestou (...); e agora nessa manhã no dia 15 de março, grande parte das pessoas, Brasil à dentro, se manifestam contra o governo petista, contra a corrupção (...). Mas todas essas manifestações estão garantidas na Constituição Federal Brasileira.

A primeira manifestação de autoridade dos Brasileiros está determinada no texto do parágrafo único do artigo 1º desta Lei Principal: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Essa garantia constitucional do Poder do Povo, se acentua nos Incisos do Artigo 5º. Em destaque o “IV” que diz:

IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato

e os seguintes:

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

(...)

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

Então, fica claro que todos – inclusive eu – podem se manifestar, contra ou em favor de algo ou alguém, e esse direito está assegurado na Constituição Brasileira. Porém, com base na mesma Lei, podemos – inclusive eu – não nos manifestarmos publicamente, como muitos fizeram e estão fazendo, ontem, hoje e “amanhã”; mas isso de forma alguma quer dizer que não esteja aqui no meu íntimo sendo totalmente favorável às manifestações populares.

Mas no jogo da política – e manifestação pública é ato político – outro componente se faz claro a séculos: o jogo de xadrez.

Esse jogo milenar foi proibido pela igreja católica – mesmo sendo jogado por seus integrantes – teve no Papa Inocêncio III, que exerceu seu pontificado entre os anos de 1198 e 1216, seu principal contribuinte e regulador, com as conhecidas “regras da moralidade”. Diria até que Inocêncio profetizou que o jogo de xadrez seria o jogo do poder – se é que já não era.

Naquela época, alguns membros da Cúria Romana passara a usar o xadrez em alegorias conhecidas como “moralidades”, prática homilética comum na literatura europeia da Idade Média, que tentava dar uma explicação simbólica ou alegórica ao jogo, tentando encontrar paralelos entre a organização da vida e atividades humanas e o xadrez. Essas alegorias geralmente consideravam o jogo como emblemático da condição social da época. Um dos mais belos textos das “moralidades”, passo a transcrever:

“A RAINHA move-se e toma [isto é, captura peças adversárias] na diagonal [essa é uma regra antiga], de modo torto, pois a mulher é tão cobiçosa que só toma tortamente, por obra da rapina e da injustiça. A TORRE é o justiceiro que percorre toda a terra em linha reta como sinal da justiça com que tudo julga e de que por nada deve seu ofício corromper-se. [...] O movimento do CAVALEIRO é composição de reto e torto. O reto, representando o direito que tem, em justiça, como senhor da propriedade, de cobrar impostos e de impor justas penas conforme o exija o delito; representando as injustas extorsões a que submete os súditos. [...] Os BISPOS movem-se oblíqua e tortuosamente duas casas [outra regra de movimento antiga] porque muitos prelados se pervertem pelo ódio, pelos presentes, ou favores para não corrigir os delinquentes nem ladrar contra os vícios, tratando os pecados como um terreno arrendado por uma taxa anual. E assim enriquecem o diabo, fomentando os vícios ao invés de extirpá-los e se tornam procuradores do diabo. [Observar o anticlericalismo do texto!] Os PEÕES são os pobres que andam uma casa em linha reta, pois enquanto o pobre permanece na sua simplicidade vive honestamente, mas, para tomar, se corrompe e o faz tortamente, pois pela cobiça se bens ou honras, sai do reto caminho com falsos juramentos, adulações ou mentiras. [...] O diabo diz: ‘xeque!’ incitando ao mal e ferindo com o dardo do pecado. E se o atingido não sai rapidamente dizendo: ‘livre!’, pela penitência e compunção do coração, o diabo lhe diz: ‘mate!’, levando sua alma ao inferno de onde não se poderá livrar de modo algum.”

O texto sobre o “REI” não foi encontrado na pesquisa para a construção deste texto, mas ele é o objeto da proteção de todas as outras peças. Quando ele, o “REI” é conquistado ou ameaçado sem possibilidade de defesa ou fuga, o jogo acaba.

Na política, esse jogo dita as regras do “jogo”. As manifestações feitas pelo Brasil no dia de hoje – iniciadas em junho de 1013 – são constitucionais, mas a movimentação das “peças” é jogo de xadrez. Mas quem são essas peças, no tabuleiro político brasileiro?

Seguindo o “roteiro” do Papa Inocêncio, posso supor que:

A “RAINHA” pode ser a CORRUPÇÃO, que corre para todos os lados capturando todos que encontra pela frente;

A “TORRE” pode ser a JUSTIÇA que só corre nas linhas retas da Justiça, mas não tem conseguido pegar a “rainha”, por ela ter “outras casas” para se esconder;

Os Cavalos ou “CAVALEIROS” podem ser os POLÍTICOS, que correm em “linha reta” e em “linha torta”, num mesmo movimento, mostrando o quanto estão suscetíveis às influências da Corrupção – que se tornou o principal movimento dos “cavaleiros” do Brasil;

Os “BISPOS” podem ser os clérigos, que cedem aos encantos da corrupção, e tal qual os Cavaleiros do Congresso, seguem os caminhos da obliquidade moral, vendendo seus rebanhos aos mesmos cavaleiros profanos;

Os “PEÕES”, os pobres coitados – como diz Inocêncio – podem ser todos que buscam de forma ignorante, defender o “REI” déspota e corrupto.

Termino este texto dizendo que qualquer pessoa tem o direito de se manifestar sobre o que desejaram e em defesa ou em crítica contra quem e contra o que desejar. Nós, povo, temos esse direito assegurado na Lei Magna e os políticos também, da mesma forma podem defender quem e o que desejarem.

No jogo do xadrez político, considero todos os que defendem de forma ignorante aos líderes políticos, sem sequem pensarem no que seus defendidos – normalmente ocupantes do Poder Executivo – estão fazendo de danoso para o País, para os Estados e para os Municípios.

É Constitucional a defesa dos interesses pessoais; É jogo de xadrez defender os interesses políticos de forma ignorante.

Dizer – como disse o presidente nacional do PT – que os brasileiros que se manifestaram contra o atual governo, contra a corrupção e contra tudo que foi colocado, não representa o País é discurso de peão; de gente que não respeita a Constituição e que tenta desqualificar tudo e todos que são contrários. Por outro lado, tal comportamento, antes de ser democrático, é ditatorialista.

Pense: quem é você nesse tabuleiro?


Boa semana.

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