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“Jesus
respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não
nascer de novo, não pode ver o reino de Deus. (...) Se vos falei de coisas
terrestres, e não crestes, como crereis, se vos falar das celestiais?”
Evangelho de João 3:3 e 12
A conversa do Messias com
Nicodemos é completamente terrena. Trata de coisas da terra, da rotina das
pessoas, das angustias diárias, dos desassossegos causados pela vontade de
mudar. Nicodemos afirma que Jesus só fazia aqueles milagres porque DEUS estava
com ele. A resposta de Jesus parece completamente sem nexo para olhos e ouvidos
repletos de religião; e foi dessa forma repleta de religião que o velho Rabino
a ouviu. Sua resposta irreflexiva mostra isso.
Nicodemos, igual a todos os
demais religiosos de sua época, estava questionando o discurso de Jesus e seus
atos milagrosos. Porém, diferente dos demais rabinos, ele foi encontrar-se com Jesus
– mesmo que de forma secreta, escondido dos olhos do clero – para apresentar
sua resposta às próprias questões. No texto Nicodemos não pergunta, ele
responde a si mesmo na presença do Mestre. Na verdade é um pergunta disfarçada
de resposta.
Jesus devolve o velho rabino à
estaca zero quanto aos seus questionamentos ao responder sua resposta: “sim,
mas para que ELE esteja, é necessário nascer de novo”. Acho que essa teria sido
a forma respondida por Jesus.
Claro que para ensinar daquela
forma, Jesus precisava da presença de DEUS; claro que para realizar os milagres
que realizava, Jesus precisava da presença DIVINA. Mas para que essa PRESENÇA
ocorresse foi necessário primeiro NASCER DE NOVO.
JESUS NASCEU DE NOVO!! ELE AFIRMA
ISSO A NICODEMOS. ESTÁ ESCRITO!
Mas o que seria “esse” novo
nascimento?
O tema tem sido debatido por
diversos teólogos em todo o mundo, mas nenhuma definição tocou meu coração. Todas
as definições e certezas apresentadas me parecem estranhas, divinas demais para
serem alcançadas. O “novo nascimento” o qual Jesus se refere na conversa
com o velho rabino é algo completamente terreno, físico, Inteligível, palpável.
Então, o que seria esse “novo nascimento”?
Em uma pequena reflexão, nascemos
quando estamos maduros; quando nos desconfortáveis dentro do ventre materno. Enquanto
o útero não nos aperta, não nos incomoda, não temos motivos para nascer. Estamos
em nossa zona de conforto. Mas quando dentro do ventre materno nossa respiração
fica ofegante pelo pouco espaço; quando esse lugar de conforto se torna
estreito, incômodo, nascemos. Nos acomodamos, nos retorcemos, nos esforçamos e
nascemos. Há medo em nascer, não sabíamos o que havia fora da casa/útero, não fazíamos
ideia que nossos pulmões iriam queimar com o ar tomando o lugar da “água”; Mas
nascemos assim mesmo. Era necessário. Se não nascêssemos, morreríamos.
Nascer para não morrer.
Reproduzirei uma parte de um
texto escrito pelo rabino Nilton Bonder, que deixa claro as etapas desse
processo de novo nascimento.
“É
fundamental mencionar que o Egito é, acima de tudo, um símbolo, por representar
um lugar que ‘já foi bom’ e deixou de ser. As analogias se tornam mais
interessantes ainda se reconhecermos que a etimologia hebraica da palavra Egito
– mitsraim – quer dizer ‘lugar estreito’.
Todos nós
deparamos com lugares que se tornam estreitos em determinado momento. Estes
lugares, que outrora serviram para nosso desenvolvimento e crescimento, se
tornam apenados e limitadores.
No processo
de saída de um lugar estreito, temos uma descrição interessante dos fatos
históricos ocorridos no relato bíblico. Segundo o mesmo, o processo de saída
esbarra num limite tão real e profundo como o mar. Arrependido por ter
permitido a saída dos hebreus após sofrer dez pragas diferentes, o faraó os
encurrala junto ao mar. Entre o exército mais poderoso do mundo de então e o
mar, os hebreus se voltam ao líder Moisés em desespero. O que fazer?
Quando
resolvemos sair do lugar estreito, ocorre um processo semelhante com o corpo. O
corpo não gosta de sair, de mudar. São a estreiteza e o desconforto que o
convencem de que não existe outra saída. Mas para onde ir se o corpo não
conhece nada diferente de si mesmo? A alma, imoral em sua proposta de
desalojamento do corpo, impõe uma caminhada que para o corpo acaba por ser um enfrentamento
com uma barreira aparentemente intransponível.
Como seguir
rumo à ‘terra prometida’, ao futuro, se entre o presente e ela existe um fosso,
um mar, absoluto. O corpo então questiona a sensatez da alma. Os portões do
passado se fecham, os do futuro não estão abertos e o corpo experimenta a mais
temida das sensações – o pânico de se extinguir.
Encurralados
diante do mar, o povo, representativo do corpo, assume algumas posturas
possíveis. De acordo com o ensinamento chassídico, existem quatro
comportamentos clássicos mencionados como quatro acampamentos. Sem saber como
proceder, o povo se divide em quatro acampamentos. O primeiro quer voltar, o
segundo quer lutar, o terceiro quer jogar-se ao mar, o quarto se mobiliza em oração.
Como
leituras da alma, essas quatro posturas representam resistências do corpo. A
própria ideia de acampar é, em si, uma forma de “empacar”. Aquele que propõe o
retorno reconhece o poder do lugar estreito. Esse lugar do hábito é tão
poderoso que foi uma ilusão se deixar levar pelo sonho de sair. Tudo estava
errado desde o início e a proposta de voltar pressupõe uma vida estreita e em
conformidade com a realidade e as limitações que esta impõe.
Lutar, por
sua vez, é a crença de que se poderá fazer do próprio lugar estreito um lugar
mais amplo. Se o lugar estreito é poderoso para impor-se como realidade, o que
resta é desafiá-lo, como se a estreiteza fosse externa e não um processo de
relação entre o mundo externo e o interno. Jamais devemos esquecer que o lugar
estreito um dia não o foi.
Jogar-se ao
mar é a atitude do desespero. É a entrega do corpo na descoberta de que a alma
propiciou um limbo insuportável em que não há mais o passado que o definia nem lhe é permitido um novo futuro que o redefina. Na busca de um novo ‘bom’, não se encontra um novo ‘correto’
e a única saída é pagar o preço de não se ter bancado o ‘correto’ do passado
mesmo que o ‘bom’ fosse inadequado. Desse desespero surge a resignação de que,
apesar de não se voltar ao lugar estreito, jamais se poderá atingir um novo lugar
amplo.
Orar é um
recurso de fazer da situação do ‘novo’ uma reprodução do lugar estreito. Numa
aparente resolução das demandas da alma, o corpo exige que a realidade seja ‘compassiva’
com ele, permitindo que o novo lugar não exija dele uma nova definição de si. O novo lugar é o velho sem parecer-lhe estreito.
Muitos de nossos sonhos do pós-vida se classificam nessa categoria.
A beleza da
interpretação chassídica está na utilização do versículo (Ex. 14:13), que
esboça a reação de Moisés, o líder e representante dos interesses da alma (o
empreendedor da saída do lugar estreito): ‘E disse Moisés ao povo: (1) Não
temais, ficai e vede a salvação do Eterno;
(2) porque os egípcios que vedes hoje não volvereis a vê-los nunca mais; (3) o
Eterno lutará por vós e (4) vós vos calareis.’
Segundo
essa interpretação, temos aqui uma resposta aos quatro acampamentos. Aos que
queriam se jogar no mar: ‘Não temais, ficai.’
Aos que desejavam voltar: ‘Não volvereis a vê-los nunca mais.’ Aos que se
propunham a lutar: ‘O Eterno lutará por vós.’ E aos que oram: ‘Vós vos
calareis.’ Nenhum dos acampamentos representa o futuro e a saída. Todos eles
são variações sobre a hesitação e a vacilação. São, na realidade, a fronteira
onde um corpo morre para renascer com uma mesma alma em outro corpo – do outro
lado da margem.
Mas, se
nenhuma dessas condutas é apropriada, qual é o caminho então? Não nos
esqueçamos da realidade que interpõe um mar entre um corpo e outro. A resposta
de D’us às vacilações do corpo, ou seja, resposta proveniente da fonte de toda
alma e todo futuro, é igualmente decisiva e intrigante (Ex. 14:15): ‘Diga a
Israel que marche.’”
Rabino Nilton Bonder - Processos de traição, A alma Imoral
É isso. “marche!”. Nasça
de novo.
Para nascer de novo não
precisamos voltar ao útero, e sim, deixar o lugar estreito onde estamos. Seja ele qual for.
Então, tenha coragem de deixar “seu”
lugar estreito para NASCER DE NOVO, QUANTAS VEZES FOREM NECESSÁRIAS.
No próximo texto tratarei dos quatro
comportamentos da vida no lugar estreito.
Deus seja conosco.
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