"Sempre fomos livres nas profundezas de nosso coração, totalmente livres, homens e mulheres.
Fomos escravos no mundo externo, mas homens e mulheres livres em nossa alma e espírito."
Maharal de Praga (1525-1609)

domingo, 4 de maio de 2014

NEM SINAL.

“Os p'rushim – fariseus – vieram e começaram a discutir com ele. Queriam que lhes desse um sinal do céu, por desejarem pô-lo à prova. Suspirando profundamente, Yeshua – Jesus – respondeu: ‘Por que esta geração deseja um sinal? Sim! Eu lhes digo, nenhum sinal lhe será dado!’. Logo após, ele os deixou, entrou novamente no barco e partiu para a outra margem do lago.” – Marcos 8:11 a 13.

No episódio imediatamente anterior, Jesus havia dividido poucos pães com uma multidão de mais de quatro mil pessoas. Ao contrário da “outra multiplicação de pães”, nessa, Ele havia provocado o milagre da divisão por entender que não havia realmente comida. Maior sinal que esse? Não era preciso.

Mas a religião e os religiosos não catalogaram e classificaram o que é e o que não é milagre. Para todos os meramente religiosos, alimentar famintos, dividir o pão com quem tem fome não é milagre. Nunca foi e nunca será. Para a religião o milagre seria se os próprios anjos de Deus viessem com cestos de ouro ornados com pedras preciosas e entupidos de maná celeste e servissem somente aos aptos para receber o milagre. Religioso pede sinal porque não enxerga o milagre que está na sua cara, na sua frente, diante de seus olhos. Mas ele, o religioso, não enxerga. Não enxerga porque não vê. Tem o coração endurecido pelo cimento da religião, está empedernido, petrificado.

A religião nos ensina que precisamos por o Eterno à prova, a religião ensina que precisamos duvidar de tudo e de todos; a religião nos ensina que as ações do Espírito Santo devem ser precedidas de algum “toque especial”. Tudo mentira.

A religião provoca em seus seguidores o fanatismo. Rabi Bonder diz que:

O fanatismo e o consumismo são lados de uma mesma moeda (...). A fonte do desejo de poder é o controle. Precisamos de controle para deter a morte. Este é o sonho messiânico de tantas correntes que expressam ignorância espiritual. A espera de que a realidade se resuma um dia às certezas é o desejo mais cruel com que convivemos. (...) O fanatismo e o consumo querem ‘colocar para dentro’ o que é externo, o primeiro pela certeza e o segundo pela posse. (...) O fanatismo privilegia a resposta, até porque se esqueceu da pergunta ou porque deliberadamente quer se ver livre da pergunta. O fanatismo quer por outra via da certeza fazer o que a ciência acalenta como agenda oculta: o controle.” 1

Foi por isso que aqueles religiosos conhecidos por nós como Fariseus pediam um sinal. Eles queriam controlar o milagre. Eles queriam controlar o “fazedor de milagres”.

Nós também agimos assim quando nos prendemos na religião para credenciar nossos milagres. Também queremos que nossas crenças nos conceitos religiosos credenciem os milagres que buscamos receber. Nossa falta de visão espiritual nos impede de enxergar o que está diante dos nossos olhos.

Quantas vezes uma enfermidade é o milagre? Quantas vezes a dor é o milagre? Quantas vezes a ausência é o milagre? Quantas vezes a perda é o milagre? Mas nosso olhar religioso não nos permite ver o MILAGRE quando ele está diante de nós, queremos um sinal, uma mostra de que aquele milagre é certamente um milagre.

Os sinais que se procuram não veem do Céu, nem de Deus, eles são provenientes da intelectualidade, da reles intelectualidade – seja ela em qualquer nível – humana. Queremos entender os mecanismos do milagre e o sinal, é esse mecanismo, que transforma o Divino em humano, o Incontrolável e controlado. O sinal que se procura pode estar na forma de um diploma, de carteira, de um título, de poder, do dinheiro, dos elogios (...).

A NECESSIDADE DE UM SINAL É PRODUTO DA FALTA DE CONFIANÇA EM DEUS. É PRODUTO DO TOTAL DESCONHECIMENTO DE QUEM É O CRIADOR DE TUDO.

Termino este texto reproduzindo trechos do Rebe Bonder:

“Em vez de um processo de vida que oferte gradativamente medos, desconfianças e confusões em altares, seus conceitos se baseiam em banir, suprimir ou exorcizar. O extremo oposto da espiritualidade não é o materialismo ou a ciência, mas o fanatismo. Como o Haf etz Chaim afirmou: ‘Com fé, não há perguntas; sem fé não há respostas.’ Há um paradoxo que, existindo sob tensão, é talvez o mais importante instrumento para lermos a realidade. A perda dessa tensão, no entanto, produz as respostas sem perguntas que a fé do fanático institui, ou as perguntas sem respostas que a ausência de fé da ciência institui. As dúvidas aplicadas às dúvidas geram verdades que são imprescindíveis às respostas, mas produzem também o efeito maligno das certezas.

As certezas, ao contrário das verdades, são um truque. E, como todo truque, não funciona na realidade, apenas aparenta funcionar. Seu funcionamento é simples, como já identificamos. Absorvem-se as respostas e descartam-se as perguntas, destruindo-se as evidências que poderiam questionar essas respostas no futuro. (...).

A resposta sem sua pergunta é fechada e intolerante; é a concretização de uma vontade.

A intolerância é a reação do amedrontado, do desconfiado e do confuso, cuja função maior é ocultar perguntas e essências.

Certa vez, um homem procurou o Rabino de Kotzk e disse-lhe que estava com problemas:
‘As pessoas me chamam de fanático. Por que me atribuem essa enfermidade? Por que não me reconhecem como uma pessoa piedosa?’O rabino respondeu: ‘Um fanático converte questões essenciais em questões marginais e questões marginais em questões essenciais’. (...).” 2

A resposta de Jesus aos fanáticos que pedem um sinal para poder acreditar na verdade foi, é e sempre será, simples direta e objetiva:

“nenhum sinal lhes será dado!”.

Pense nisso.

“O fanatismo consiste no ato de redobrar esforços por conta de se ter esquecido dos objetivos.” 3

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1. Fronteiras da Inteligência, Senso de tolerância. pgs. 116 e 117.
2. Fronteiras da Inteligência, Senso de tolerância. pgs. 117 e 118.

3. George Santayana.

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